
Michael Eisner, que comandou a Disney por mais de duas décadas, relançou seu livro Camp: Life, Leadership, and Why You Never Stop Paddling (Acampamento: Vida, Liderança e Por Que Você Nunca Deve Parar de Remar, em tradução livre), em que relembra os verões que passou no Camp Keewaydin, nos Estados Unidos. Segundo ele, essa vivência ajudou em sua visão de liderança, trabalho em equipe e responsabilidade, e pode ser uma referência interessante para quem pensa em como oferecer boas experiências de aprendizado para crianças e jovens atualmente.
O acampamento onde Eisner passou parte da infância era voltado para atividades ao ar livre, como trilhas e travessias de canoa. Nessas situações, os jovens tinham que montar acampamento, fazer fogo, preparar comida e limpar tudo depois, sempre em equipe.
“Não era exatamente sobrevivência, porque ninguém corria risco. Mas era preciso chegar ao acampamento antes do anoitecer, montar barraca, cozinhar, limpar… tudo isso exigia liderança e cooperação”, contou ao Inc.com.
A experiência, segundo ele, fazia os jovens se colocarem em posições de responsabilidade e tomarem decisões práticas, algo que nem sempre acontece em ambientes mais protegidos ou voltados apenas para atividades escolares.
A importância de ajudar os outros
Uma das frases mais repetidas pelos monitores do acampamento era: “ajude o outro colega”. Eisner lembra que, mesmo soando como um clichê, o ensinamento acabava sendo internalizado.
“Se você está carregando uma canoa com outro garoto menor que você, tem que ajudar. Se alguém não consegue montar a barraca e chove à noite, todo mundo vai se molhar. Então você aprende que precisa colaborar, porque o grupo depende disso.”
Esse tipo de aprendizado prático, segundo ele, faz com que valores como solidariedade e empatia sejam vividos no dia a dia, e não apenas discutidos de forma teórica.
Conviver com pessoas diferentes

Eisner também destacou a diversidade do acampamento, que recebia crianças de diferentes países e contextos.
“Tinha muitos garotos da América do Sul, cujas famílias queriam que eles aprendessem inglês. Depois de um dia, todos eram iguais. Isso não acontece com tanta facilidade entre adultos.”
Esse tipo de convivência, de acordo com Eisner, ensina tolerância e respeito de forma natural, algo valioso para qualquer cultura — especialmente em tempos de redes sociais, onde bolhas de opinião e isolamento são comuns.
Muitos anos depois de ter deixado o acampamento, Eisner foi surpreendido por uma carta da filha de um antigo monitor, Eddie Dobson, que na época tinha 90 anos e vários livros escritos, mas guardados. Eisner leu um dos textos e se interessou tanto que comprou os direitos para produzir uma série de TV baseada na obra.
“Achei que seria ruim, como acontece com muitos materiais enviados sem pedido. Mas era excelente. Minha esposa leu e disse: ‘Isso aqui prende a atenção’. Estamos tentando transformar em série. Agora só falta convencer uma plataforma a bancar o projeto.”
Para ele, essa história mostra como vínculos criados na juventude podem continuar relevantes décadas depois — inclusive em parcerias profissionais.
Afastamento da tecnologia como parte da proposta
O acampamento também tem uma política clara sobre o uso de eletrônicos. Nada de celulares, tablets ou videogames durante a estadia. Os aparelhos podem até ser levados, mas são guardados assim que os jovens chegam ao local.
“Hoje em dia isso é ainda mais importante”, aponta Eisner, sugerindo que experiências longe das telas ajudam a desenvolver concentração, sociabilidade e autonomia.
Embora o modelo de acampamentos ao estilo norte-americano não seja tão comum no Brasil, os princípios levantados por Eisner, como convívio fora da zona de conforto, cooperação, autonomia, diversidade e tempo longe da tecnologia, podem ser aplicados em outras atividades, como programas educativos, intercâmbios, excursões ou projetos sociais.
Mais do que a estrutura do local, o que faz a diferença é proporcionar experiências que ensinem na prática o valor da convivência, da responsabilidade coletiva e da iniciativa própria. E, como mostra a trajetória de Eisner, essas lições podem acompanhar uma pessoa por toda a vida.