Os estúdios da Disney em Burbank, na Califórnia, ainda têm aquele clima de “mágica feita à mão”. Logo na entrada, as enormes estátuas dos Sete Anões em homenagem a Branca de Neve e os Sete Anões continuam ali. Mas, dentro dos prédios, a coisa é bem mais moderna. Em 2025, a Disney já testa sistemas de inteligência artificial para agilizar o trabalho dos animadores.
Em um evento recente, a Disney convidou jornalistas e executivos para assistir à apresentação de startups focadas em IA. A estrela do dia foi a Animaj, uma empresa que mostrou como consegue produzir episódios de animação muito mais rápido do que antes.
Na tela, os personagens coloridos de Pocoyo dançavam e pulavam. Mas o que parecia só mais um desenho infantil foi, na verdade, feito em uma fração do tempo habitual.
Segundo a Disney, o uso da ferramenta da Animaj faz parte do programa Disney Accelerator 2025, que apoia startups com investimento, mentoria e projetos reais dentro do estúdio. E os resultados são claros.
Antes, um episódio de cinco minutos podia levar até cinco meses para ser concluído. Agora, o mesmo trabalho fica pronto em menos de cinco semanas.
O CEO da empresa, Sixte de Vauplane, explicou: “Os artistas ainda desenham as poses principais, mas a IA completa os movimentos entre elas em questão de segundos.”
O artista continua no comando
A Disney faz questão de reforçar que a IA não está lá para substituir ninguém. A ideia é tirar do artista as partes mais repetitivas e deixar mais tempo para o que realmente importa: criatividade.
O vice-presidente de inovação da Disney, David Min, explicou que o estúdio analisou milhares de startups antes de escolher a Animaj. Enquanto outras ferramentas tentam gerar animações inteiras com simples comandos de texto, a Disney preferiu uma solução que mantém o artista no controle.
Funciona assim: o animador desenha as principais poses do personagem e a IA cria os quadros intermediários automaticamente. Se algo sai errado, o artista corrige com poucos cliques. Como o sistema foi treinado apenas com imagens oficiais do próprio programa, os personagens nunca perdem o estilo original.
A empresa diz que isso é essencial para manter a identidade visual que a Disney construiu ao longo de quase um século.
Por que a pressa aumentou
O streaming mudou o ritmo de tudo. Antigamente, um estúdio podia levar anos para produzir uma animação. Hoje, plataformas como o Disney+ precisam de novos conteúdos com muito mais frequência.
Com o uso da IA, a empresa consegue testar ideias em menos tempo. Se um piloto agrada ao público, ele pode virar série rapidamente. Se não funciona, o time parte para outro projeto sem grandes perdas.
A Animaj também usa uma segunda IA que analisa o que os jovens estão comentando nas redes sociais. Assim, os roteiristas podem criar episódios inspirados em temas ou piadas que estão em alta.
Bastidores da nova mágica
Quem visita os estúdios pode ver os animadores usando o sistema ao vivo. De um lado da tela, aparece o esboço de um personagem. Do outro, a versão finalizada em 3D se move conforme o desenho.
O artista levanta o braço do personagem no desenho, e o modelo digital repete o movimento instantaneamente. Algo que antes levaria horas de ajustes, agora acontece em segundos.
A IA da Animaj ajuda principalmente em duas tarefas:
- Interpolação de movimento, desenhando automaticamente os quadros entre as poses principais;
- Proteção de estilo, garantindo que os personagens mantenham sempre o mesmo visual, baseado em centenas de milhares de desenhos originais.
Com isso, o trabalho manual diminui, e os animadores podem se concentrar mais em expressões, humor e ritmo das cenas.
O que os artistas estão dizendo
Nem todo mundo está empolgado. Muitos animadores temem que o uso da IA possa reduzir vagas no setor. O sindicato Animation Guild tentou incluir proteções específicas sobre inteligência artificial em seus contratos, mas poucas foram aprovadas.
A Disney e a Animaj afirmam que o objetivo é agilizar processos, não substituir pessoas. Eles dizem que os profissionais ainda serão indispensáveis para as decisões criativas.
Historicamente, a animação sempre evoluiu junto com novas ferramentas: do pincel no vidro, ao papel, ao computador e, mais tarde, à animação 3D. Agora, a inteligência artificial é apenas o próximo passo.
Sob o mesmo sol da Califórnia que um dia iluminou Walt Disney, uma nova geração de animadores está aprendendo a dividir o trabalho com máquinas inteligentes. A diferença é que, agora, a mágica acontece em um ritmo bem mais acelerado.